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De 1977 a 2017

  • Publicado: Quarta, 10 de Mai de 2017, 12h49
  • Última atualização em Quarta, 10 de Mai de 2017, 12h52

“40 anos de ensino na Ufop ”

Caio Henrique Duarte Gonzaga

O Prof. Dr. Hubert Mathias Peter Roeser, natural da Alemanha, comemorou, no dia 14 de março, 40 anos de trabalho e vivência na Escola de Minas. Nesse período, foram centenas as atividades como bancas, palestras, orientações de trabalhos acadêmicos e congressos. Paralelo a isso, participou ativamente na criação e coordenação de diversos projetos, como a Sociedade Brasileira da Geoquímica e a Academia de Ciências de Ouro Preto. Com a mesma disposição, ele nos conta um pouco sobre sua trajetória.

 

(Clausthal, Alemanha 1984. Acervo pessoal)

EM - Como foi sua vinda para a E.M?

Eu vim pela primeira vez para Ouro Preto por meio de um convênio entre a Escola de Minas de Ouro Preto e a Academia de Minas (mais tarde Universidade Técnica) de Clausthal, Alemanha, em 1973, como estudante. De setembro de 1973 até novembro de 1974, fiz o trabalho de campo para a minha tese na região de Mariana – Monsenhor Horta – e Sta. Barbara – Fonseca. Durante esse tempo, também trabalhei em Bento Rodrigues, distrito de Mariana. Fiquei 14 meses em Ouro Preto e fiz amizade com alguns colegas no DEGEO, os quais conseguiram um convite para eu lecionar durante 1 ano na Escola de Minas. Assim voltamos – eu e minha esposa que também é mineralogista – no início de 1977 para Ouro Preto. A nossa intenção era ficar 1 ou no máximo 2 anos.

 

EM - Como aconteceu de um contrato de 1 ano ter-se transformado em 40 anos?

 

Na segunda metade da década de 1970, a Universidade era um mercado de trabalho pouco atraente e houve uma falta de professores. Assim, o então Reitor mudou meu contrato temporário e me ofereceu uma vaga permanente. As enormes possibilidades de pesquisa geológica, diretamente em frente da sua porta, fizeram Ouro Preto interessante. Além do meu salário, recebi um auxílio do Ministério da Economia alemão e, depois, uma bolsa do CNPq. Assim, a posição em Ouro Preto melhorou para mim. Também recebemos apoio para pesquisas e equipamentos do CNPq, DFG, Fundação VW etc. Então eu fiquei por mais 5 anos, depois de 1978. Em meados dos anos 80, a situação no mercado para os geólogos na Europa não era boa. Então ficamos mais 5 anos, depois 10 anos, 15, 25, 35, 40...

 

(Degeo visto do Morro da Forca, 1984. Acervo pessoal)

 

EM - O que mudou na Escola de Minas em termos de ensino e pesquisa? As condições de trabalho melhoraram? Qual a diferença daquela época para hoje?

A Escola de Minas dos anos 70 e a de hoje já não são mais comparáveis. Em 1977, estudavam cerca de 1.500 alunos em Ouro Preto; hoje, são 12.000 (ou mais). Naquela época, estudava-se em Ouro Preto  Mineração, Engenharia Civil, Geologia, Metalurgia ou Farmácia. Hoje a UFOP oferece cerca de 40 cursos. Existia ainda um único curso de Pós-Graduação na EM, que logo fechou. Hoje, há cerca de 60 (totalizando mestrado, mestrado profissional, doutorado e especialização). Tudo isso explica por si as mudanças que acontecerem. E, particularmente em relação à EM, justamente na época do seu centenário, em 1976, a Escola de Minas havia chegado, em muitos aspectos, ao fundo do poço. Este não é o lugar para se discutir detalhadamente a situação. Em seu livro sobre a história da EM, José Murilo de Carvalho faz um diagnóstico muito preciso da situação naquele momento. Hoje, 40 anos mais tarde, é possível dizer a esse respeito que “jogos políticos” contribuíram para aquela calamidade de maneira considerável. É um dos méritos do convênio que citei inicialmente, por ter contribuído significativamente para melhorar esta situação. Hoje, a EM, e em especial a Geologia, se equiparam a muitas outras instituições de pesquisa no mundo.

 

EM - Sobre o perfil dos alunos, houve mudanças?

 

Claro que existem alterações, o que é inevitável em 40 anos. Novas formas de comportamento, novas formas de pensar, novas músicas etc. Em muitos aspectos, a situação dos estudantes melhorou. O fato de que hoje mais e mais alunas estudam em Ouro Preto, tem, na minha opinião, contribuído para a redução do machismo, mesmo ele não sendo ainda totalmente vencido. O nível de muitos estudantes tem aumentado em termos de idiomas, mas também ainda há demanda reprimida. Os alunos são hoje mais independentes, mais cosmopolitas, uma vez que estágios no exterior são quase a regra. Isso contribui enormemente para quebrar estereótipos e abrir o horizonte intelectual. No entanto, observo certa fraqueza na redação, ou seja, observo cada vez mais uma dificuldade em redigir textos, principalmente científicos, que muitas vezes aparecem bem “secos”, sem grande eloquência. Isso certamente é influenciado pelas novas técnicas e facilidades na informática. Usar o “CTRL + C / CTRL + V” é mais fácil do que escrever um texto próprio, mas mesmo isso não pode ser generalizado.

 

EM - Como a profissão influenciou sua vida pessoal?

 

Eu ainda sou mineralogista de espírito, mesmo trabalhando já por 10 anos na Engenharia Ambiental (no DEAMB). Estou feliz de ter trabalhado por tanto tempo em um paraíso mineralógico e me sinto profissionalmente realizado!  E o trabalho na universidade também  me alegra até hoje. O sentimento de ainda ser necessário e útil e ser capaz de passar minha experiência para os jovens é muito bom, e, em particular, o contato diário com os jovens me mantém jovem. Não há tempo para envelhecer.

 

EM - O que de melhor aconteceu em sua carreira de professor?

 

Muitas coisas, mas uma delas foi ser escolhido 16 vezes como professor homenageado dos formandos.

 

EM - O que quis realizar como professor e não conseguiu?

 

Escrever um livro sobre Geoquímica Ambiental. A minha própria meticulosidade alemã me atrapalha: quando chego ao quinto capítulo, já começo a reescrever e corrigir o primeiro. Mas ainda há um tempinho para terminá-lo...

 

EM - Pretende continuar trabalhando para chegar aos 45 anos de profissão?

 

Se for possível, e se Deus me der saúde, até os 50!!!

 

EM - Lembra-se de alguma história curiosa acontecida na escola nesses 40 anos?

Sim, muitas. Uma pode-se chamar hoje de pitoresca, ao contrário daquela época: a nossa prisão pelo DOPS em uma excursão geológica em 1977 para Belo Horizonte. Os detalhes posso contar um dia num boteco tomando um chope...


(Trabalho de Campo, 1973. Acervo pessoal)

 

EM - Conte um pouco sobre sua história pessoal, infância e família.

 

Eu sou - graças a Deus - nascido depois da guerra. Éramos quatro filhos. Embora os pais não fossem ricos, eles conseguiram que três dos quatro filhos estudassem. Agradeço-lhes por isto até hoje. Deve ser mencionado também que o governo alemão começava naquela época (década de 60) a conceder bolsas de estudo, permitindo assim que as pessoas de menor renda pudessem estudar. No entanto, era necessária qualificação, ou seja, sempre notas boas.

Nossa infância foi bonita, não é comparável com a de hoje. Sem televisão, sem carros na estrada, a gente jogava futebol na rua principal. Sem Internet, IPhone etc., a comunicação era feita por carta. Quem tinha dinheiro usava telefone. Notícias e jogos de futebol eram recebidos através do rádio. Lembro-me até hoje da final da Copa do Mundo de 1958: Brasil x Suécia. Todos nós torcemos pelo Brasil, porque a Suécia havia derrotado a Alemanha nas semifinais. Talvez nós vivêssemos de forma mais simples, mas certamente, felizes. Não havia esse estresse por querer mais e mais: mais alto, mais rápido, mais rico... O meu neto, com menos de um ano, tem já mais brinquedos do que eu em toda a minha infância. No entanto, ficávamos satisfeitos, tivemos mais imaginação para brincar. Quando o tempo permitia, brincávamos fora, no campo da mata. Fazer fogo e outras coisas perigosas era comum. Para muito do que fizemos, hoje chamariam a polícia ou o Ministério Público.

Frequentei o segundo grau (chamado na Alemanha ginásio) num colégio de padres e estudei Latim e Grego. Na época, detestava isso, mas hoje agradeço pela oportunidade, pois nesse meio tempo eu percebi o significado do velho provérbio romano: Non scholae sed vitae discimus (Nós não aprendemos para a escola, mas para a vida). Comecei a estudar na Universidade Gutenberg, em Mainz, em 1968, no curso de Física; depois mudei para a Mineralogia, porque não gostava da matemática. Terminei o meu doutorado em 1977 em Clausthal, com nota 10.

Sou casado desde 1976 com uma mineralogista. Nós nos conhecemos no Instituto de Mineralogia e temos dois filhos. Nossa filha se graduou pela EM na primeira turma de Engenharia Ambiental e fez o doutorado na Alemanha. Nosso filho é engenheiro aeronáutico e está fazendo doutorado na Technische Universität Braunschweig, na Alemanha. Enquanto isso, Ouro Preto se tornou a nossa segunda casa e estamos felizes no Morro São Sebastião, um dos bairros mais bonitos de Ouro Preto. Como hobbies tenho jardinagem, viagens, leitura e estou escrevendo um livro sobre a história da família no qual, entre outros assuntos, quero apresentar nossa vida em Ouro Preto.

 

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